segunda-feira, 13 de março de 2017

Charles Baudelaire e William Carlos Williams: Uma Reflexão sobre Edgar Allan Poe


Edgar Allan Poe representa, tanto para Baudelaire, como para William Carlos Williams, uma nova literatura que nasce nos Estados Unidos oposta à cultura utilitária e industrialista que caracteriza o novo continente. Poe é um oxímoro, o aristocrata maldito, um espírito do velho continente que ousa romper as leis da literatura europeia, mas eternamente ostracizado e criticado pelo seus compatriotas como senhor de um génio macabro, louco e arrogante. No início de Eureka, porém, escreveu: "Ofereço este livro àqueles que puseram a sua fé nos sonhos como se da única realidade se tratassem". Para os norte-americanos do seu tempo, consumidos pela baba do patriotismo que inundava as suas críticas, Poe era dono de um estilo artificial e sem conteúdo que renunciava ao verdadeiro espírito da Poesia. Estas críticas ganharam voz através de Lowell:

Here comes Poe with his Raven, like Barnaby Rudge-
Three fifths of him genius, and two fifths sheer fudge;
Who talks like a book of iambs and pentameters
In a way to make all men of common sense damn meters
Who has written some things far the best of their kind;
But somehow the heart seems squeezed out by the mind.

A simples, mas destrctiva resposta de Poe a esta crítica de Lowell, cristaliza e justifica o seu estilo: "Observamos aqui que a ignorância profunda sobre qualquer assunto, manifesta-se sempre com alguma alusão ao "senso comum". Como refere William Carlos Williams, Poe poderia ter ido mais longe na sua defesa, acrescentando o que disse numa outra instância: "A mais alta ordem do intelecto imaginativo é sempre preeminentemente matemático".

Com isto não quer Poe dizer que renega a emoção em favor da razão, mas algo mais do que isso,mele molda a emoção através do seu génio minucioso. A necessidade de Poe de construir um novo começo, livre da influência da "imitação colonialista", era a força que se apoderava de toda a sua obra. A imaginação era para ele, retomando as palavras de Baudelaire, "a rainha de todas as faculdades; (...) A imaginação é uma faculdade quase divina que apreende de imediato e sem métodos filosóficos, as relações internas e secretas das relações entre coisas, as correspondências e as analogias".

William Carlos Williams tem uma ideia análoga à de Baudelaire, mas acrescenta uma dimensão temporal e espacial ao génio de Poe; recusando, tal como Baudelaire, a epígrafe do escritor louco com laivos de génio que os seus críticos teciam. Poe, contra a corrente moralista do seu tempo, prova, que a literatura não representa uma mera cortesia, mas antes, a verdade. Esta verdade, porém, só existe se quem a escrever for livre, se a sua vontade não se subjugar a ideias pré-concebidas do que deve ser a obra literária. A grande diferença entre os críticos que defamavam a sua obra e de quem a defende, é que os primeiros olhavam apenas a superfície (a métrica, o simbolismo rebuscado, as aliterações do dó, ré, mi) e os últimos reconheciam o indivíduo que se queria repensar a e recriar a literatura americana. Era necessário separar-se da "massa disforme" que o assombrava na literatura do seu tempo e cultivar, assim, um novo começo literário nos Estados Unidos. Nas palavras de William Carlos Williams, Poe podia absorver a cultura literária francesa, espanhola ou grega e não se sentir tentado a copiar; podia fazê-lo porque existia em si uma ideia de um espaço seu, capaz de ser cultivado. 




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