domingo, 11 de outubro de 2015

Presentation of "Why Waste Our Time on Rewrites" (André Lefevere) by Constança and Tânia


Em “Why waste our time on rewrites? – The trouble with interpretation and the role of rewriting in an alternative paradigm”, André Lefevere começa por falar de interpretação literária. Segundo ele, há quem defenda que não há interpretações literárias melhores ou mais verdadeiras do que outras.
Nas palavras de Lefevere, se uma interpretação não tiver de ser verdadeira, acontecerá que o intérprete poderá escrever o que quiser sobre literatura – tornando-se simplesmente num escritor e não num académico – e que não haverá critérios para a avaliação de uma interpretação, fazendo com que esta não se possa considerar ou incluir no trabalho académico. Desta maneira, o autor critica o estudo da literatura que se centra na interpretação literária, visto que considera errado que esta finja ser objectiva e científica (isto é, que dê a ideia de que descreve ou interpreta obras literárias “vistas de fora”) enquanto se mantém partidária e subjectiva (ou seja, tenta influenciar o desenvolvimento de uma determinada literatura e encaminhá-la na direcção que coincide com a poética e a ideologia da escola de interpretação do momento).
Em vez de uma abordagem em que o estudo da literatura se centra na interpretação literária, Lefevere sugere uma abordagem que explique como a escrita e a reescrita da literatura se submetem a certas condicionantes (ou seja, que descreva como a literatura é um fenómeno social ao serviço de uma determinada ideologia e de uma determinada poética) e como a interacção entre ambas é responsável pela elevação ou rejeição de determinados autores e determinadas obras.É neste sentido que, em seguida, se fala do sistema literário, um conjunto de pessoas e instituições que agem sobre a literatura (agentes) e um conjunto de factores que influenciam o funcionamento ou a realidade da literatura (condicionantes).
Os sistemas evoluem de acordo com o princípio da polaridade, que defende que todos os sistemas irão, eventualmente, criar o seu “contrasistema”. A evolução do sistema literário é um jogo complexo da tendência contra um estado controlado, contra as duas tendências opostas acima mencionadas e contra a maneira com a qual o mecenato lida com estas tendências.  
A primeira condicionante do sistema literário, a poética, age no interior deste, mas de acordo com os parâmetros definidos pela segunda condicionante que se encontra fora do sistema (ou seja, no seu ambiente). A primeira condicionante é então formada pelos intérpretes, críticos, autores de recensão crítica, professores de literatura e tradutores. Estes poderão, por vezes, reprimir determinadas obras literárias por irem evidentemente contra a ideia dominante do que a literatura deve ser ou deveria poder ser (isto é, a poética) e/ou a ideia dominante do que a sociedade deve ser ou deveria poder ser (isto é, a ideologia, a cosmovisão ou visão do mundo) segundo uma certa sociedade, num certo período de tempo.
Também sobre esta condicionante, Lefevere diz que ainda assim, estes “reescritores” poderão, de modo mais frequente, adaptar obras literárias até que estas correspondam à poética e à ideologia do seu tempo.
A poética é o código com que opera o sistema literário, o que torna possível a comunicação entre o autor e o leitor. Consiste em dois componentes:
·      Inventário de “instrumentos” literários; Ex.: géneros, símbolos, situações, personagens, etc;
·      Conceito do que é ou deveria ser o papel da literatura. Este conceito é bastante importante na escolha de temas, que devem ser relevantes para a sociedade para serem reconhecidos.
A componente funcional da poética está ligada intrinsecamente às influências ideológicas que provêm do exterior da esfera da poética, estas geradas por forças ideológicas no “ambiente” do sistema literário.
A codificação da poética conduz também à canonização de obras de escritores que entrem em conformidade com a poética codificada. As obras desses escritores são então usadas como exemplo a seguir para futuros escritores e ocupam uma posição central no ensino da literatura.
A reescrita ocupa um papel fundamental na canonização destas obras literárias. No entanto, um cânone apenas se torna reconhecido como tal através do ensino.
O segundo fator de controlo, o que opera maioritariamente fora do sistema literário, são os patronos ou, mais propriamente, os mecenas, em grande parte responsáveis pela transmissão de ideologia. Os mecenas e as instituições controladas pelos mesmos têm o poder de “censurar” ou validar a escrita, a leitura e a reescrita da literatura. Os mecenas raramente influenciam diretamente o sistema literário, recorrendo maioritariamente a instituições. Este fator está intrinsecamente ligado à ideologia.
O mecenato consiste em três componentes, que podem interagir entre si de forma variada. A primeira componente é a ideológica, que age como moderadora na escolha e no desenvolvimento da forma e do assunto. A segunda é a económica, na qual os mecenas devem certificar-se que o escritor/reescritor recebe o que é devido pelo seu trabalho. A terceira e última componente é a do estatuto, que assinala a entrada numa elite ao ser aceite pelos mecenas.
Toda a escrita de literatura age sob as duas condicionantes acima mencionadas, o mecenato e a poética, e às quais devemos juntar mais duas condicionantes.
·      Universo do discurso, ou seja a quantidade de coisas de que se pode falar num determinado espaço social e num determinado período.
·      Língua natural; Ou seja, a língua em si. A gramática, a forma e tudo o que diz respeito à língua em si.
No que diz respeito à reescrita, uma quinta condicionante deve ser adicionada – o original. O original é onde a ideologia, a poética, o universo do discurso e a língua se juntam. Todas as reescritas de literatura, seja interpretação, crítica, historiografia, a junção de antropologias ou a tradução, agem sob, pelo menos, uma condicionante acima mencionada e implicam as restantes. Por isso, a reescrita, em todas as suas formas, deve ser estudada como uma arma que na luta para a supremacia entre várias ideologias e várias poéticas.
A tradução é a forma mais óbvia de reescrita, pois opera sob as cinco condicionantes. Se uma tradução for aclamada pelo público, é certo que mais cedo ou mais tarde estará presente numa antologia e será a impressão que os não-falantes da língua do original terão da obra.
A tradução opera, em primeiro lugar, sob a condicionante do original. Em segundo lugar, a linguagem natural muda, drasticamente. Em terceiro lugar, o universo do discurso impõe bastantes problemas para conseguir obter a tão aclamada “tradução fiel”. As características do universo do discurso condicionam aquilo a que se dá ênfase ou subalternização em cada cultura. São as mais difíceis de traduzir.
Concluindo, a tradução é o sinal visível da abertura do sistema literário, de um sistema literário específico. A tradução abre as portas ao que pode ser chamado de subversão e transformação, dependendo onde os guardiões da poética e da ideologia dominante se encontram. Não é de estranhar que tenha havido e haja todo o tipo de tentativas para regular a atividade de tradução.
Apesar de a tradução ser bastante importante na transformação da literatura, não é a única responsável pela mesma, sendo que conta com outras formas de reescrita. Assim, a tradução não deverá ser estudada isoladamente, mas sim em conjunto com as outras formas de reescrita.

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